O prémio Nobel da Física 2020 para buracos negros foi o coroar do trabalho de toda uma comunidade científica internacional durante mais de um século. Essa atribuição deu-nos o ímpeto para homonegear tais objetos dedicando-lhes uma edição especial da prestigiada Gazeta de Física.
O conceito de buraco negro nasceu da convergência de duas direções distintas. Por um lado, apareceram soluções exatas das equações da teoria da relatividade geral para um corpo esfericamente simétrico. Estas soluções, de difícil interpretação física, direcionaram uma investigação ativa para a sua melhor compreensão como objetos geométricos do espaço-tempo. Por outro lado, cimentou-se a constatação teórica e observacional que estrelas muito diferentes do Sol, as estrelas compactas, existem.
A descrição científica da Natureza pretende ser universal e simplificadora. Tem conseguido explicar uma variedade de fenómenos, numa variedade de contextos, através de um pequeno número de princípios e atores. Uma ilustração extraordinária deste poderoso princípio é a “hipótese de Kerr”: que todos os buracos negros (em equilíbrio) do Cosmos são essencialmente iguais, tendo apenas duas propriedades físicas (um número e um vector) que os podem diferenciar entre os seus pares. Esta simplicidade, a ser verdade, é única no mundo macroscópico e uma consequência da absoluta ditadura da gravidade sobre estes objetos, que reduz à irrelevância as forças não gravitacionais. Neste artigo, apresentamos a hipótese de Kerr como resultado da evolução histórica do conceito de buraco negro, e nas palavras de alguns dos seus protagonistas.
Em contraste com muitos dos termos formais usados na física, o “horizonte de eventos” é abençoado com um nome que dá um sentido útil ao seu significado na linguagem comum (isto, é não-científica).
Alguns dicionários online, por exemplo, oferecem as definições:
- Evento; algo que acontece. [Merriam-Webster] [1].
- Horizonte; o limite ou alcance da perceção ou conhecimento (ou noções semelhantes) [Dictionary. com] [2].
A partir destes conceitos familiares, e aplicando apenas um toque de raciocínio motivado, podemos sugerir um esboço de definição para o horizonte de eventos do seguinte tipo:
- Horizonte de eventos; a fronteira daquilo que é sempre percetível.
Os buracos negros são uma das mais fascinantes previsões da Relatividade Geral, a extraordinária teoria da gravitação divulgada ao mundo por Albert Einstein em 1915. O que se passa no seu interior tem entusiasmado a nossa curiosidade coletiva e esse fascínio tem sido o motor de notáveis avanços científicos, que têm acompanhado e impulsionado o desenvolvimento da teoria.
Neste artigo de divulgação, vamos concentrar-nos naquilo que a análise da geometria e dinâmica das equações de Einstein (ver Figura 1), devidamente temperada por factos observacionais estabelecidos, nos diz sobre o que se passa no interior dum buraco negro. Vamos recordar como a interpretação da gravitação enquanto deformação da geometria do espaço-tempo, a essência da Relatividade Geral, nos puxa para o conceito de buraco negro, analisar se a formação de singularidades no seu interior é ou não é uma inevitabilidade e discutir, no contexto das Conjeturas da Censura Cósmica, o que essa formação, ou falta dela, nos diz acerca dos limites da teoria de Einstein.
O Prémio Nobel da Física de 2020 foi atribuído (em parte) ao físico matemático britânico Sir Roger Penrose (fig. 1) “pela descoberta de que a formação de buracos negros é uma previsão robusta da Teoria da Relatividade Geral”. De acordo com o comité Nobel, Penrose “usou métodos matemáticos engenhosos na sua prova de que os buracos negros são uma consequência direta da Teoria da Relatividade Geral de Einstein” [1]. Neste artigo, vamos tentar explicar qual foi a contribuição de Penrose para estabelecer os buracos negros como objetos físicos reais, hoje em dia indispensáveis na nossa compreensão do Universo.
Formulada por Einstein em 1915, a Relatividade Geral é rotineiramente considerada uma das mais belas teorias jamais descobertas. Esta teoria postula que a gravidade não é mais do que uma propriedade geométrica do espaço e do tempo, que são descritos em Relatividade através do conceito quadridimensional de espaço-tempo. A curvatura do espaço-tempo está relacionada com o seu conteúdo de matéria e energia através das equações de campo de Einstein (fig. 1). Uma das mais espectaculares previsões destas equações é a existência de buracos negros – soluções das equações de Einstein no vácuo definidas por um horizonte de acontecimentos, ou seja, uma região do espaço da qual nada (nem mesmo a luz) consegue escapar. Buracos negros são objectos macroscópicos fascinantes e extremamente simples – são totalmente caracterizados pela sua massa e momento angular – e têm sido amplamente estudados nas últimas décadas.
O mais recente prémio Nobel da física foi atribuído em outubro de 2020 conjuntamente a Roger Penrose, pela descoberta teórica da inevitabilidade da existência de buracos negros, e a Reinhard Genzel e Andrea Ghez, pela sua cofirmação observacional na forma de um buraco negro supermassivo no centro da nossa própria galáxia [1].
É importante recordar que este reconhecimento chegou pouco mais de cem anos depois da descoberta da primeira solução não-trivial da Relatividade Geral, a qual corresponde a um buraco negro isolado e estático. Chegou também com mais de 50 anos de atraso em relação aos resultados publicados por Penrose que lhe valeram o prémio Nobel! Aprópria génese do nome ”buraco negro” remonta também a esses anos dourados da Relatividade Geral [2]. Contudo, nas últimas duas décadas buracos negros têm brilhado sob as luzes da ribalta.
A existência de galáxias no primeiro milhar de milhões de anos do Universo, na chamada Época de Reionização, encontra-se hoje estabelecida. Se uma parte destes sistemas aparenta brilhar devido a radiação produzida por estrelas, alguns, de propriedades extremas, quasares, brilham devido à queda violenta de matéria para um buraco negro supermassivo. Atingindo massas de 109 massas solares (M⊙), a formação de tais objetos em apenas algumas centenas de milhões de anos, é de difícil compreensão, mesmo com os modelos teóricos mais avançados. Nos últimos anos, tornou-se premente a identificação e caracterização destes quasares na Época de Reionização do Universo, algo que parece essencial para compreender a formação de galáxias e de estruturas, a reionização do hidrogénio neutro durante os primeiros 800 milhões de anos, e a formação dos primeiros buracos negros no Universo. Neste artigo, discutirei o desafio da procura destes primeiros buracos negros supermassivos do Universo, as estratégias que nos estão a revelar, lenta mas inevitavelmente, os quasares mais distantes, e como procuramos hoje planificar a exploração do primeiro milhar de milhões de anos do Universo com a próxima geração de telescópios.
Metade do Prémio Nobel da Física do ano de 2020 foi atribuído conjuntamente a Reinhard Genzel e Andrea Ghez pela “descoberta de um objeto compacto supermassivo no centro da nossa galáxia”. Neste artigo, tentamos explicar esta descoberta usando conhecimentos de Física do 12.º ano e uma linguagem coloquial. A nossa abordagem não é histórica, tenta apenas, usando o conhecimento atual, explicar a descoberta.
O artigo inicia-se por uma contextualização do “buraco negro” na nossa galáxia e do método usado na medição da sua massa. Seguidamente, o instrumento GRAVITY, que foi central nas descobertas, é apresentado assim como as deteções do desvio para o vermelho gravitacional e da precessão de Schwarzchild. Terminamos com uma contextualização destas descobertas. A nossa galáxia é um disco Vivemos numa galáxia com forma aproximada1 de um disco com espirais de gás, poeira e estrelas, o disco tem uma espessura de cerca de 0.3 kpc (a luz demora cerca de 3,3 anos a viajar 1 kpc) e diâmetro de cerca de 50 kpc 2. A primeira pergunta que nos surge é como sabemos que a galáxia tem esta forma?
A 10 abril de 2019, foi publicada a primeira fotografia astronómica de um buraco negro e da sua misteriosa sombra. Esta imagem, amplamente partilhada pela comunicação social no mundo, abriu um novo capítulo na história da Ciência. Um dos motivos para a sua importância é o facto de esta fotografia permitir sondar o campo gravitacional extremo em redor de um buraco negro, abrindo assim a porta a novos testes à teoria da Relatividade Geral de Einstein, num regime praticamente inexplorado. A incrível complexidade do processo para obter esta fotografia é um feito inatingível por um único ser humano que merece também ser celebrado como uma vitória da engenhosidade e cooperação humanas. Este artigo pretende esclarecer o leitor curioso que queira saber mais sobre esta observação significativa, que permitiu conferir aos buracos negros uma acrescida credibilidade experimental, certamente determinante para a atribuição do prémio Nobel da Física 2020.
1. Uma nova luz
No dia 14 de setembro de 2015 às 09:53 UTC, Marco Drago, um jovem investigador pós-doutoral no Instituto Max Planck de Física Gravitacional em Hanover, Alemanha, recebeu um alerta por e-mail de um protocolo computacional de tratamento de dados, um sistema automático que filtra potenciais sinais de eventos reais nos dados que estão a ser coletados pelos detectores do LIGO (Laser Interferometer Gravitational Wave Observatory), localizados em Livingston e Hanford, nos EUA. O sinal era tão alto, claro e perfeito que, a princípio, o investigador achou que o sinal não era real.
Os buracos negros são objetos extraordinários, nas suas várias facetas.
Em primeiro lugar, porque são feitos apenas de espaço-tempo. É o próprio vácuo, curvado sobre si mesmo, que os constitui. Apesar do seu nascimento ser causado pelo colapso de uma estrela, o material da estrela progenitora está para lá do horizonte de eventos. O que fica no exterior é a geometria mais simples possível. De facto, um dos resultados mais importantes em física de buracos negros diz respeito à unicidade da sua geometria: em situações de equilíbrio, a massa, carga elétrica e a rotação do buraco negro são suficientes para caracterizar toda a geometria exterior. Este resultado é impressionante quando comparado com a complexidade do planeta Terra ou de um único ser vivo. Não existem montanhas em buracos negros. É costume dizer-se que os buracos negros não têm “cabelo”, onde “cabelo” representa a informação que normalmente associamos a objetos terrestres.
Analisamos os prémios Nobel de física para a astrofísica e a gravitação desde a criação do prémio e destacamos o prémio Nobel de física 2020 para buracos negros. Comentamos sobre nomes que poderiam ter ganho o prémio em astrofísica e gravitação e especulamos sobre futuros ramos destas áreas da física que poderão ser contemplados com o prémio Nobel.
1. Introdução
O prémio Nobel de física, outorgado pela Academia Real de Ciências Sueca a cientistas e a trabalhos excecionais, iniciou-se em 1901, tendo nesse ano sido atribuído a Röngten, um físico alemão, pela “descoberta dos notáveis raios aos quais foi subsequentemente dado o seu nome” (texto entre aspas significa uma tradução livre da declaração em inglês do comité Nobel). Estes raios, conhecidos como raios X, são radiação eletromagnética de alta energia. O prémio é concedido anualmente e até aos dias de hoje várias áreas da física tiveram o privilégio de serem agraciadas com essa magnífica distinção.
A 8.ª Edição do Encontro de Professores de Física e Química (EPFQ) teve lugar no dia 9 e 10 de setembro no Colégio Luis Verney da Escola de Ciências e Tecnologia da Universidade de Évora (UE). Estes Encontros iniciaram-se na Universidade do Algarve em 2005 e a partir da 3.ª edição têm sido da responsabilidade da Delegação Regional Sul e Ilhas da SPF em parceria com uma instituição de ensino superior que assume a sua organização local de duas edições.
Já estão disponíveis as Atas da 3.ª Conferência de Física dos Países de Língua oficial Portuguesa, realizada em Maio de 2019, bem como o livro com textos baseados nas comunicações feitas no mesmo evento.
A conferência foi subordinada ao tema “A Física para o Desenvolvimento Equilibrado“.
Para mais informações consultar https://www.ufplp.org/Publicacoes
É com grande pesar que a Sociedade Portuguesa de Física comunica o falecimento, a 18 de abril de 2021, do Professor Doutor Armando José Ponce Leão Policarpo, Professor Catedrático aposentado da Universidade de Coimbra, fundador do Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas (LIP) e sócio honorário da SPF. Apresentamos à família, colegas e amigos sentidas condolências.
O desaparecimento do Professor Armando Policarpo, no passado mês de Abril, exige que se fale aqui da obra e personalidade de um investigador de mérito, que desenvolveu trabalho de elevado rigor científico e abriu perspetivas de desenvolvimento de tecnologias de detecção de radiação inovadoras.
Faleceu na madrugada do passado dia 18 de junho o nosso colega Eduardo João Cardoso Martinho.
Nascido em 1936 na Chamusca, de origens humildes, veio a licenciar-se em Ciências Físico-Químicas na Faculdade de Ciências de Lisboa em 1961, tendo sido admitido nesse mesmo ano no então recentemente inaugurado Laboratório de Física e Engenharia Nuclear (LFEN), em Sacavém.
Na passada noite de 9 de outubro de 2021, teve lugar a Young Minds’ Movie Night, no claustro do Museu de História Natural e da Ciência de Lisboa. Esta atividade foi organizada pela Young Minds Lisbon, um projeto da European Physical Society desenvolvido por investigadores e estudantes de Física em Lisboa, e contou ainda com o apoio da Sociedade Portuguesa de Física.