A Climatologia também é Física
For a long time, at an enormous number of stations all over the world, meteorologists have been collecting data concerning temperature, humidity, rainfall, and wind conditions in a systematic fashion that would have delighted Francis Bacon. But it is a matter of record that this branch of science has not (inductively or in any other way) developed a useful theoretical structure as have physics, chemistry, biology, and geology.
I. Bernard Cohen (1985)
Esta frase do ilustre historiador da ciência I. Bernard Cohen (1914-2003) traduz a ideia que lamentavelmente teima em persistir na mente de cultos, e menos cultos, de que a atividade de meteorologistas e climatologistas se reduz à recoleção de informação acerca do estado do tempo no Globo terrestre, chegando a qualidade dos dados recolhidos a ser posta em causa sempre que os resultados das observações revelam sinais de mudanças sistemáticas no clima imputáveis à atividade humana.
O prémio Nobel da Física deste ano, cuja metade foi atribuída aos climatologistas Syukuro Manabe e Klaus Hasselmann, para além de reconhecer o trabalho científico de dois cientistas ímpares, vem fazer justiça à Climatologia ao reconhecê-la como Física aplicada ao Geofluido, colocando-a em pé de igualdade com outras disciplinas como a Mecânica Quântica ou a Cosmologia.
Graças ao Professor José Pinto Peixoto (1922-1996), a Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa teve a oportunidade de beneficiar em primeira mão dos conhecimentos de ponta proporcionados pelo Geophysical Fluid Dynamics Laboratory (GFDL) na Universidade de Princeton (EUA), onde Manabe desenvolveu os primeiros modelos tridimensionais da circulação geral da atmosfera e fez estudos de sensibilidade do clima aos forçamentos antropogénicos.
As estreitas ligações entre o Professor Peixoto e os investigadores de topo em Dinâmica do Clima estão bem patentes num livro editado pela Academic Press em 1983, significativamente intitulado Theory of Climate. Trata-se da coletânea das atas do simpósio comemorativo dos duzentos anos da Academia das Ciências de Lisboa organizado pelo Professor Peixoto, então presidente da Academia. O simpósio, que decorreu há precisamente quarenta anos (12 a 14 de outubro de 1981), reuniu cientistas eminentes na área da Climatologia, sendo de sublinhar a presença de Joseph Smagorinsky (1924-2005), o primeiro diretor do GFDL e de Edward Lorenz (1917-2008), um dos fundadores da teoria do caos. Merece ser aqui destacada a comunicação intitulada Carbon Dioxide and Climatic Change da autoria de Syukuro Manabe, em que se revelam surpreendentemente atuais as conclusões obtidas a partir dos resultados de estudos de sensibilidade CO2-clima efetuados com os modelos de circulação geral da atmosfera daquela época:
Some of these CO2-induced changes are listed below:
De mencionar, finalmente, que, para a comunidade científica portuguesa, a atribuição parcial do prémio Nobel da Física a dois climatologistas abre com chave de ouro o ano em que se comemoram os trinta anos da publicação do livro Physics of Climate, editado em 1992 pelo American Institute of Physics, da autoria de José Pinto Peixoto e de Abraham Oort, cujos ensinamentos têm vindo a influenciar gerações sucessivas de climatologistas de todo o mundo.
Capa do livro Theory of Climate, editado em 1983 pela Academic Press e fotografia dos cientistas que participaram no simpósio comemorativo dos duzentos anos da Academia de Ciências de Lisboa, de 12 a 14 de outubro de 1981.
Carlos Câmara
Professor no DEGGE-FCUL